
Em qualquer ambiente de trabalho, mas especialmente no setor público educacional, é comum observar um fenômeno recorrente sempre que ocorrem mudanças de gestão: a desconfiança em relação aos servidores que atuavam na equipe anterior. Essa postura, embora compreensível em contextos marcados por tensões políticas ou administrativas, revela uma fragilidade gerencial que precisa ser superada com maturidade e profissionalismo.
É essencial lembrar que o servidor público da educação, antes de qualquer cargo comissionado ou função de confiança, é, por definição, alguém aprovado por concurso público, legalmente habilitado e tecnicamente capacitado para o exercício de suas atribuições. Sua presença nas instituições educacionais não é fruto de nomeações passageiras, mas da conquista de um direito legítimo de servir ao bem público com conhecimento técnico, compromisso pedagógico e responsabilidade social.
Com mais de 25 anos de vivência na educação pública, atuei diretamente nas grandes mudanças de governança da rede estadual de ensino de Pernambuco, iniciadas com o governo de Eduardo Campos, por treze anos consecutivos. Posteriormente, estive por mais dois anos na educação da nossa Capital, à frente de programas voltados à gestão escolar, ao gerenciamento de rede, ao monitoramento de dados e à coordenação de setores dedicados ao atendimento socioemocional — sempre com grandes equipes que ali já estavam em atuação. Os dez anos anteriores a essa trajetória de liderança foram vividos em sala de aula, em supervisão escolar, como professora da Educação Infantil ao Ensino Médio. Essas experiências me ensinaram, acima de tudo, que a boa gestão educacional começa pela escuta atenta e pelo reconhecimento do valor de quem já construiu e continua construindo a política pública no cotidiano das escolas.
Tive, ao longo dessa caminhada, a oportunidade de compor e liderar equipes em diferentes contextos, desde processos que exigiram profundas reformulações até ajustes pontuais de demandas e setores. E o que sempre orientou minhas ações foi uma premissa básica: ao assumir qualquer função de gestão educacional, o primeiro passo não é excluir, desconfiar ou rotular, mas sim compreender. Compreender os projetos em andamento, os resultados já alcançados, as estratégias utilizadas e, sobretudo, escutar. Escutar com humildade e respeito aqueles que permanecem, pois eles carregam a memória institucional, conhecem os caminhos, os desafios e podem, sim, ser grandes aliados na construção de uma nova fase.
A gestão na educação pública não é um campo de batalha entre o novo e o antigo. É, antes de tudo, um espaço coletivo de construção, onde diferentes experiências e saberes devem convergir para o bem comum. A imposição cega de vontades sem escuta, a tentativa de apagar contribuições passadas e a criação de narrativas que associam permanências à sabotagens ou boicotes, revelam mais sobre a insegurança de quem assume do que sobre a real capacidade técnica dos servidores. Isso, sim, é a verdadeira fragilidade de uma gestão.
Portanto, a qualquer gestor ou gestora da educação que ainda nutre desconfiança gratuita diante daqueles que permanecem: ouça, observe, analise com isenção. Não projete em terceiros a responsabilidade por eventuais desafios futuros. O servidor da educação pública não é um obstáculo, mas um pilar de continuidade, de estabilidade e de compromisso com os resultados que realmente importam, o aprendizado dos estudantes.
E se ainda assim persistirem dúvidas, deixo um lembrete que o tempo sempre confirma: o mundo dá voltas. Hoje se lidera, amanhã se segue; hoje se desconfia, amanhã se é posto à prova. E, nestas voltas, é sempre melhor ser lembrado como alguém que soube respeitar, escutar e construir pontes – do que como aquele que, por medo, preferiu erguer muros.
A verdadeira força de uma gestão educacional está na sua capacidade de unir e valorizar as pessoas. E isso só é possível para quem lidera com coragem, sabedoria e generosidade.
Janaína Bezerra
Professora
Analista em Gestão
Gerente de Ensino