
Por Uanderson Melo
Se você acha que segurança pública é apenas um bordão de palanque ou um plano de governo para próxima eleição, pense novamente. Em Pernambuco, a situação saiu das planilhas e chegou à delegacia, chegou à pauta das polícias e agora bate forte no coração do governo.
A saída do delegado-geral da Polícia Civil de Pernambuco (PCPE), Renato Márcio Rocha Leite, oficializada esta semana, não é apenas a troca de um comando ou uma dança dos bastidores. É o reflexo de um abismo entre quem governa e quem investiga, entre discurso e realidade, entre fachada e base.
Enquanto a governadora Raquel Lyra (PSD) distribui sorrisos, entregas e anúncios, os agentes de segurança pública enfrentam condições de trabalho que beiram o escândalo. Delegacias sem água, sem papel, sem ventilação adequada. Policiais fazendo vaquinhas para comprar água para beber nos plantões. É o retrato de uma prioridade invertida: imagem em primeiro lugar, operacional em segundo.
Não bastasse isso, o governo anunciou recentemente uma liberação de milhões em verba de propaganda. Não há oposição à comunicação oficial, mas a dúvida que fica é: por que investir na forma quando a função está com defeito? Quando o tema é segurança, investimento de fundo de palco não salva vidas. Estrutura salva vidas.
O Sindicato dos Policiais Civis de Pernambuco (SINPOL-PE) não está mais na retaguarda. A mobilização anunciada para dezembro e a possibilidade de paralisação falam de insatisfação real.
Os policiais civis, investigadores, escrivães, peritos e agentes não querem banners. Eles querem:
- Salários em dia (e valorização real).
- Equipamentos decentes.
- Delegacias estruturadas.
- Reconhecimento formal e operacional.
- Diálogo com o governo.
A falta de diálogo já virou pauta pública. A saída de Renato Leite foi apenas a erupção de um vulcão que vinha se formando há meses.
Este movimento todo lança sombra sobre o governo de Raquel Lyra. Segurança pública é insumo básico da legitimidade de qualquer governo, quando falta, o eleitor sente. O fato de os agentes estarem tão abertos à mobilização indica que a crise tem profundidade.
Enquanto isso, opositores observam atento. Um governo que perde o comando da polícia arrisca perder também a narrativa de controle e competência. E no palco eleitoral de 2026, quem transmite ordem tem vantagem.
Se a corrupção, o crime organizado ou as facções assustam, o que dizer de um Estado onde os agentes de segurança se sentem abandonados? A pergunta é direta: quem manda de fato? Quem dá a última palavra, o governo que anuncia ou a corporação que investiga?
O Palácio do Campo das Princesas precisa responder não com atos de marketing, mas com atos reais. Uma nova chefia é apenas parte da solução. A outra parte é estrutura, gestão, respeito.
Pernambuco está em um momento decisivo: ou o governo assume que segurança pública é prioridade absoluta ou continuará a gastar na vitrine enquanto as bases ruem. A troca de comando na Polícia Civil é o aviso: o relógio da paciência toca.
Se a engrenagem do Estado continuar lenta e confusa, o eleitor verá que nem tudo o que reluz é eficiência. Precisamos de resultados. Precisamos de segurança. Precisamos de compromisso. E precisamos que o discurso case com a realidade das delegacias, das viaturas, dos plantões, dos investigadores.
Porque num Estado onde a polícia se sente invisível, o crime se sente livre.




