
Por Uanderson Melo
A política brasileira, que há tempos se equilibra entre o espetáculo e o absurdo, acaba de ganhar mais um capítulo digno de um roteiro de novela: a prisão, e logo em seguida a libertação, do ex-ministro do Turismo Gilson Machado Neto. O motivo? Segundo informações preliminares, ele teria tentado ajudar Mauro Cid o ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, a conseguir um passaporte para fugir para Portugal. Só que o “fugitivo” em questão… já é cidadão português. Precisa dizer mais?
O pedido de prisão partiu da Procuradoria-Geral da República (PGR), e foi prontamente aceito pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). O mesmo Moraes que, horas depois, revogou a prisão. Um ato que, além de gerar estranheza jurídica, escancarou a instabilidade de decisões que deveriam ser técnicas, firmes e consistentes. Em vez disso, parecem tomadas com base no clamor político ou na conveniência momentânea.
A ironia dessa história é que, no Brasil de hoje, três ingredientes costumam garantir o sucesso de um político: voto, dinheiro e… ser vítima de alguma injustiça. E Gilson Machado, que já vinha sendo cotado para disputar o Senado por Pernambuco, ganhou de bandeja o terceiro elemento. O que parecia uma tentativa de desmoralização pode ter sido, na prática, a consagração de sua pré-candidatura. Alexandre de Moraes, sem querer, pode ter decidido quem será o próximo senador do estado.
É evidente que a Justiça deve investigar, coibir e punir eventuais crimes, seja do lulismo ou aqueles ligados ao bolsonarismo. Mas quando a PGR se presta a pedir prisão com base em boatos mal costurados e o STF age como se estivesse num tabuleiro político, a democracia sai arranhada. O problema não é investigar Gilson Machado, o problema é transformá-lo em símbolo de algo que, até agora, carece de provas, de lógica e de coerência.
E enquanto isso, o povo observa entre indignado e entediado mais um capítulo de exageros, vaidades e decisões questionáveis. A sensação é que a toga anda pesando mais que a Constituição, e que alguns gabinetes, em Brasília, confundem justiça com justiçamento.
Se eu fosse Gilson Machado, pegaria a sanfona, subiria no palco do São João de Caruaru e tocaria em tom de deboche uma bela homenagem ao Brasil real. Porque, cá entre nós, depois dessa lambança judicial, ele já tem até o figurino pronto para a campanha: o de perseguido político.
E o povo? Esse vai dançando ao som de decisões que não tocam mais a música da credibilidade.
Uandeson Melo é jornalista, radialista e teólogo