
Vivemos em um mundo que nos convida, o tempo inteiro, a escolher onde colocar o olhar e o coração. Para alguns, o trabalho é o eixo de tudo: produzir, conquistar, alcançar metas, deixar marcas. Para outros, o amor conjugal parece conter em si todo o sentido da vida, como se o encontro com o outro fosse suficiente para silenciar todas as inquietações da alma. Há ainda os que acreditam que o dinheiro, a diversão ou o poder concentram o resumo da existência, como se o acúmulo, o prazer ou o domínio fossem capazes de preencher todos os vazios.
Nada disso é pequeno. Tudo isso é importante. O trabalho dignifica, o amor humaniza, o dinheiro organiza, a diversão alivia, o poder — quando bem exercido — pode servir. Mas nenhum desses pilares, isoladamente ou somados, consegue tocar a região mais profunda do ser. Existe um espaço silencioso dentro de nós que o mundo não alcança, por mais sofisticadas que sejam suas ofertas. Um vazio que não é falha, mas chamado.
É nesse ponto que precisamos lembrar de uma verdade que atravessa o tempo e as tradições espirituais:
“Não somos matéria vivendo uma experiência espiritual, nós somos espíritos vivendo uma experiência na carne como oportunidade para depuração.”
Essa afirmação desloca tudo. Ela reorganiza prioridades. Ela nos obriga a perguntar se estamos vivendo apenas para manter o corpo ocupado ou se estamos permitindo que a alma amadureça.
Quando colocamos todo o foco apenas no que é externo, algo dentro de nós se esgota. O sucesso pode vir acompanhado de cansaço existencial. O amor pode se tornar dependência. O dinheiro pode perder o gosto. A diversão pode se tornar fuga. O poder pode isolar. Isso acontece porque essas dimensões pertencem ao mundo da forma, enquanto a essência humana habita um plano mais profundo.
A vida na carne é breve, imperfeita e desafiadora — e justamente por isso é preciosa. Cada dificuldade carrega um convite à lapidação. Cada encontro é uma aula. Cada perda, um espelho. Estamos aqui não para acumular, mas para aprender; não para dominar, mas para compreender; não para vencer o outro, mas para vencer a si mesmo.
O verdadeiro foco não exclui o mundo, mas o transcende. Trabalhamos, amamos, cuidamos, construímos — mas sem esquecer que tudo isso é meio, não fim. O fim é o crescimento interior, o refinamento dos sentimentos, a ampliação da consciência, a capacidade de amar com menos ego e mais verdade.
Quando essa compreensão desperta, algo muda silenciosamente. Passamos a viver com mais propósito e menos ansiedade. Com mais presença e menos apego. Com mais sentido e menos medo. A vida deixa de ser apenas uma corrida contra o tempo e passa a ser uma experiência de despertar.
Talvez a grande pergunta não seja o que estou buscando, mas quem estou me tornando enquanto busco. Porque, no fim, o mundo pode até nos oferecer muitas coisas — mas é a alma, e somente ela, que sabe o que realmente viemos fazer aqui.
Jairo Lima é artista plástico, poeta e escritor




