
É comum, a cada temporada de chuvas, ouvirmos gestores públicos alegarem que “choveu mais do que o esperado”. Frases como “foram 500 mm quando se esperava 200 mm” ou “280 mm quando a previsão era de 100 mm” tornaram-se recorrentes. No entanto, essa narrativa soa mais como uma desculpa do que uma explicação plausível. Afinal, a gestão pública não pode operar sem considerar margens de erro, pois é justamente nesses desvios que residem os maiores riscos.
O Brasil tem enfrentado, com frequência alarmante, desastres naturais que expõem a fragilidade das administrações municipais diante de eventos climáticos extremos, cada vez mais crescentes. A tragédia no Rio Grande do Sul, em maio de 2024, é um exemplo emblemático. Chuvas intensas e enchentes devastadoras afetaram mais de 2 milhões de pessoas, resultando em 147 mortes e 127 desaparecidos. Apesar de alertas meteorológicos emitidos com antecedência, as ações preventivas foram insuficientes.
Segundo especialistas, os sistemas de defesa civil estavam despreparados, e os planos de contingência eram inexistentes ou desconhecidos pela população. Em Petrópolis, no Rio de Janeiro, em 2022, uma tempestade inesperada causou 241 mortes. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) havia emitido alertas, mas a intensidade do fenômeno superou as previsões, e as medidas preventivas foram ineficazes. No litoral norte de São Paulo, em fevereiro de 2023, chuvas de mais de 600 mm em 24 horas resultaram em 65 mortes. Apesar das previsões de chuvas fortes, a infraestrutura local não suportou a intensidade do evento, evidenciando novamente a falta de preparo das autoridades. Diversos fatores contribuem para o despreparo das prefeituras brasileiras diante de desastres naturais.
A falta de planejamento urbano, com ocupação desordenada de áreas de risco e sem fiscalização adequada, é uma das principais causas. Soma-se a isso a infraestrutura deficiente, como sistemas de drenagem ineficientes e ausência de obras de contenção. Outro ponto crítico é a desvalorização da prevenção: investimentos em medidas preventivas costumam ser negligenciados em favor de ações emergenciais, que rendem mais visibilidade política.
A desinformação da população e a ausência de uma cultura de educação ambiental também agravam o problema, já que os cidadãos não sabem como agir nem como se proteger. Para enfrentar esses desafios, é fundamental que as prefeituras elaborem e implementem planos de contingência específicos para cada tipo de desastre, envolvendo a comunidade e realizando treinamentos regulares.
É igualmente importante investir em infraestrutura resiliente, com sistemas de drenagem eficientes e obras de contenção. Campanhas educativas acessíveis devem ser promovidas para aumentar a conscientização sobre riscos e estratégias de prevenção. As equipes de defesa civil precisam ser capacitadas e equipadas de forma adequada, garantindo respostas rápidas e eficientes. Além disso, o uso de tecnologia e dados meteorológicos deve ser integrado à gestão pública, permitindo a antecipação de eventos críticos e a atuação preventiva. As catástrofes naturais que assolam o Brasil não são imprevistos incontroláveis, mas, em grande parte, o resultado direto de falhas de planejamento, omissão e despreparo. A insistência em discursos que culpam a imprevisibilidade do clima não se sustenta diante das ferramentas disponíveis hoje.
É urgente que os gestores públicos abandonem o discurso do imprevisto e passem a assumir a responsabilidade de proteger suas comunidades com ações concretas, bem planejadas e sustentáveis. O preço da omissão está sendo pago em vidas humanas e tragédias que poderiam, em boa parte, ser evitadas. Exemplos internacionais demonstram que é possível enfrentar desastres naturais de forma eficaz.
O Japão, por exemplo, é reconhecido por sua expertise em gerenciamento de riscos, devido às características geológicas e à experiência com desastres naturais. Na Coreia do Sul, após o tufão Maemi em 2003, o governo implementou a “Lei Básica de Gerenciamento de Emergência e Segurança”, estabelecendo um sistema nacional de gerenciamento de emergência. O Japão, por sua vez, investe continuamente em infraestrutura resiliente e sistemas de alerta precoce, minimizando os impactos de terremotos e tsunamis. Esses exemplos ressaltam a importância de políticas públicas eficazes e investimentos em prevenção para mitigar os efeitos de desastres naturais.
Jairo Lima é membro da Academia Cabense de Letras, artista plástico e pós-graduado em gestão pública